domingo, 1 de março de 2009

Rock Brasil 1

A história do rock no Brasil deu muitas voltas desde o seu começo oficial, no dia 24 de outubro de 1955, quando foi lançada, na voz de Nora Ney, a música Ronda das Horas. Era uma versão em ritmo de fox para Rock Around the Clock, um dos primeiro sucessos do rock’n’roll, escrito por Max C. Freedman e Jimmy Knight e gravado por Bill Haley & His Comets. Depois desse inusitado disco inaugural, os brasileiros viram aquela subversiva novidade americana ser assimilada pelos compositores nacionais (em 1957, Cauby Peixoto gravou o primeiro exemplar nacional, Rock and Roll em Copacabana, de Miguel Gustavo), gerar seus primeiros ídolos tupiniquins (Cely Campello, de Estúpido Cupido e Banho de Lua, e Sérgio Murilo, de Broto Legal), ensaiar suas primeiras apologias ao mau comportamento (em Rua Augusta, com Ronnie Cord, ou melhor, Ronaldo Cordovil) e inspirar o primeiro movimento de afirmação da cultura jovem brasileira – a Jovem Guarda de Roberto e Erasmo Carlos, com sua rebeldia cuidadosamente calculada. Com esse impulso, as guitarras elétricas passaram a dar o tom para a farra da garotada, misturando-se sem problemas, a partir da Tropicália (1967), com os mais tradicionais gêneros da música brasileira. Cara de bandido Passada a revolução promovida por Caetano, Gil e os Mutantes, o rock adquiriu uma posição marginal no cenário da música brasileira. A emergência da MPB, o clima pesado da repressão política, o auge do desbunde, tudo isso colaborou nos anos 70 para que, como bem observou Rita Lee certa vez, o roqueiro brasileiro tivesse cara de bandido. Mas, apesar de nenhum movimento ter se configurado a partir do rock nessa época, os valores individuais garantiram que a década estivesse longe de ser perdida. Um dos maiores ídolos roqueiros surgiu nessa época: o baiano Raul Seixas, misturando Elvis, Luiz Gonzaga, esoterismo e pura provocação (com ou sem o parceiro Paulo Coelho) em músicas como Gita, Ouro de Tolo, Metamorfose Ambulante e Maluco Beleza. Egressa dos Mutantes, Rita Lee turbinou seu som com a banda Tutti Frutti e virou a grande dama do rock brasileiro a partir do disco Fruto Proibido (1975). Os Novos Baianos (de Moraes Moreira, Pepeu Gomes e Baby Consuelo) levaram adiante as idéias de fusão da Tropicália, assim como o pernambucano Alceu Valença, pai do forrock. Já os Secos & Molhados adaptaram o glitter rock de David Bowie à música folclórica de diversas procedências, criando um sucesso nunca antes visto (o disco de estréia, em 1973, que trazia a canção O Vira transformou-os em recordistas de vendas). De quebra, a banda revelou um dos grandes intérpretes da MPB: o camaleônico vocalista Ney Matogrosso. Na segunda metade da década, as obstinadas bandas que insistiam em fazer rock no Brasil geralmente tendiam para o hard (O Peso, Made In Brazil, a Patrulha do Espaço de Arnaldo Baptista, Bixo da Seda, A Bolha), ou para o progressivo (O Terço, Som Nosso de Cada Dia, os velhos Mutantes – então capitaneados pelo guitarrista Sérgio Dias –, Moto Perpétuo, Casa das Máquinas, Módulo, Som Imaginário, Veludo Elétrico, Vímana, Terreno Baldio). Mas ainda havia ainda o rock rural de Sá, Rodrix & Guarabira, o pré-punk do Joelho de Porco e as experimentações inclassificáveis de Tom Zé e Walter Franco. Era toda uma força roqueira que seria dizimada a partir de 1977, com a massificação nas rádios brasileiras do fenômeno da discoteque – que passou como um rolo compressor, já que fazer dançar não era lá uma das grandes qualidades do rock daquela época. Rita Lee foi um dos que embarcaram na onda disco, dando início à sua fase Banho de Espuma. Por uma nova linguagem O começo da década de 80 não foi nada propício para o rock. Reinava a MPB de FM e, apesar da relativa abertura política, a sombra da repressão e a censura ainda desanimavam os que tentavam ser tematicamente ousados. O "som jovem" possível na época era o pop-rock de artistas como Guilherme Arantes (ex-Moto Perpétuo), Marina, Ney Matogrosso, Angela Rô Rô, 14 Bis (dos ex-Terço Flávio Venturini e Magrão), Beto Guedes, Eduardo Dusek (que apareceu no Festival MPB-80, vestido de anjo, para defender a apocalíptica Nostradamus), Baby Consuelo, Pepeu Gomes, A Cor do Som e Rádio Táxi (banda do ex-Made In Brazil Wander Taffo e do ex-Tutti Fruti Lee Marcucci, que teve o sucesso Garota Dourada). A garotada, porém, exigia uma nova

linguagem musical, em que os seus temas básicos (amor, diversão, trabalho, família) fossem tratados de forma mais clara e despojada. Com o rock básico e os cabelos curtos e espetados da new wave (que substituía na Inglaterra e nos Estados Unidos o rebuscamento e o peso dos cabeludos), a renovação do Rock Brasil começa a se processar logo no início da década. Antenado com aquelas novas tendências, o jornalista e discotecário Júlio Barroso fundou a banda Gang 90, que trazia no seu bojo as Absurdetes (ou seja, as vocalistas Alice Pink Pank, May East, Lonita Renaux e Luísa Maria). O estouro se deu no Festival MPB Shell de 1981, quando apresentaram o reggae Perdidos na Selva, cuja letra falava de um improvável acidente de avião com final feliz e reproduzia a linguagem e as referências dos filmes B e das histórias em quadrinhos. Era só uma mostra do que estaria por vir no ano seguinte, aquele em que o rock enfim configuraria um movimento cultural no Brasil. Assim como a Gang 90, os atores do grupo teatral carioca Asdrúbal Trouxe o Trombone experimentavam um enfado com a caduquice e o excesso de seriedade da música brasileira. Numa temporada dividida com Marina no Teatro Ipanema, em idos de 1981, o asbrúbal Evandro Mesquita e o baterista Lobão (ex-Vímana) tiveram a idéia de montar uma banda de rock teatral. Deste último, veio o nome: Blitz, já que eles estavam sempre sendo parados nas batidas policiais. Juntando a irreverência praieira do Asdrúbal a um rock direto, cantado por uma dupla de meninas bonitas (Márcia Bulcão e Fernanda Abreu), a banda caiu como uma luva no espaço para shows que abriu em pleno verão de 1982 na praia do Arpoador: o Circo Voador. Com Ricardo Barreto (guitarra), Antônio Pedro (ex-Mutantes, baixo) e William Forghieri (ex-Gang 90, teclados), a Blitz causou tanto burburinho na noite carioca que conseguiu um contrato para gravar um compacto – o de Você Não Soube Me Amar, história de um desencontro amoroso, cantada (quer dizer, mais falada que cantada) na linguagem malandra dos jovens da Zona Sul carioca. Fenômeno nacional Lançado em junho, o compacto (que no lado B, trazia apenas Evandro dizendo "Nada, nada, nada...") vendeu 100 mil cópias em três meses. Lançado em setembro, o primeiro LP da banda, As Aventuras da Blitz, que trazia ainda as músicas Mais Uma de Amor (Geme Geme) e De Manhã (Aventuras Submarinas) , transformou a banda num fenômeno nacional. Mais dois discos (Radioatividade, 1983, e Blitz 3, 1984), centenas de shows, um punhado de sucessos (Weekend, Bete Frígida, Egotrip) e a banda terminava em 1986. Voltaria, anos mais tarde, sem Fernanda Abreu, para repetir os sucessos. Pouco depois do lançamento de As Aventuras da Blitz, Lobão saltou do barco e conseguiu uma gravadora para lançar seu disco solo, Cena de Cinema, que havia sido feito um ano antes, com os amigos (Marina e músicos da Blitz, inclusive). Começava aí uma carreira das mais importantes do Rock Brasil, de um artista sempre inconformista, que gravou discos clássicos como Ronaldo Foi Pra Guerra, O Rock Errou, Vida Bandida (que refletiu suas experiências no mês em que esteve preso na Polinter por porte de droga) e músicas mais ainda – Me Chama (regravada por Marina e ninguém menos que João Gilberto), Corações Psicodélicos, Revanche, Vida Bandida, Chorando no Campo e Essa Noite Não. Em 1982, ainda apareceriam mais autores de alta relevância no Rock Brasil. Passada a fase Nostradamus, Eduardo Dusek embarcou em uma viagem rock, no disco Cantando no Banheiro, gravado com uma banda carioca que seguia o estilo de rock dos anos 50, com muito bom humor: João Penca & Seus Miquinhos Amestrados. Entre seus integrantes, havia um irreverente goiano com uma mão muito boa para a composição: Léo Jaime, que escreveu o grande sucesso de Cantando, o Rock da Cachorra. Os Miquinhos seguiriam depois sem Dusek e sem Léo, que iniciou uma carreira solo repleta de sucessos, como Sônia, O Pobre e As Sete Vampiras. No mesmo ano ainda se viu a estréia em LPs do ex-Vímana Lulu Santos (que estourou a faixa-título, Tempos Modernos) e do Barão Vermelho (que passou em branco), além do nascimento, em Niterói, da Rádio Fluminense, grande divulgadora das fitas demo e discos das novas bandas de rock. Paralelamente, explodia em São Paulo o movimento punk, no festival O Começo do Fim do Mundo, com bandas furiosas como Inocentes, Ratos de Porão, Cólera e Olho Seco. Em 1983, o rock não era mais um estranho no ninho da música brasileira, conquistando generosos espaços na imprensa e levando as gravadoras a perder seu medo de contratar bandas. A gravação de Ney Matogrosso para Pro Dia Nascer Feliz apresentaria ao país o Barão Vermelho e sua promissora dupla de compositores: Roberto Frejat e Cazuza, o poeta exagerado. O LP Rock Voador (resultado da dobradinha Circo Voador-Rádio Fluminese) revelou o Kid Abelha e Suas Abóboras Selvagens e o guitarrista de blues-rock Celso Blues Boy. Uma das bandas que tinha sua fita demo executadas na Fluminense, o Paralamas do Sucesso, gravou seu primeiro compacto: Vital e Sua Moto/Patrulha Noturna, cujo relativo sucesso levou, no fim do ano, ao primeiro LP, Patrulha Noturna. Modernidade e romantismo Mas quem arrebentaria a boca do balão naquele ano seria um outro ex-Vímana também metido a fazer discos-solo: o inglês Richard Court, o Ritchie. Sua música, Menina Veneno, um elegante tecnopop puxado por modernos teclados, vendeu mais de 800 mil cópias, um sucesso sem precedentes para o Rock Brasil. Em pouco tempo, essa espécie de Bryan Ferry em português chegaria ao LP (Vôo de Coração) que, catapultado por sucessos como Casanova e A Vida Tem Dessas Coisas, chegou ao milhão de cópias vendidas, batendo até o grande vendedor de discos da gravadora, Roberto Carlos. O Rock Brasil conquistava o respeito comercial e gerava, como contrapeso, uma série de produtos descartáveis, hoje objeto de culto por colecionadores mais fanáticos, como o Absyntho (do Ursinho Blau Blau), Grafite (Mamma Maria) e Bom Bom (Vamos A La Playa). Fenômeno até então predominantemente carioca (afinal, era no Rio que estavam as sedes das grandes gravadoras e a atenção da mídia nacional), o rock começa a fervilhar também em São Paulo naquele 1983. A cidade que era sacudida simultaneamente pelos punks e pelo movimento de vanguarda musical (de Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção, Rumo, Premeditando o Breque e Língua de Trapo), revelou mais uma das grandes bandas do Rock Brasil: Os Titãs (ex-Titãs do Iê-Iê), um octeto que tinha uma aproximação new wave-tropicalista do rock e ganhava cada vez mais popularidade com seus shows escalafobéticos. Era a ponta-de-lança de um rock paulistano, de nomes como o Magazine (do sucesso Eu Sou Boy), o pós-punk Ira! e o irreverente Ultraje a Rigor. Gravado num estúdio de jingles, o primeiro e homônimo LP dos Titãs, com as músicas Sonífera Ilha, Babi Índio, Marvin e Go Back (música sobre poema do tropicalista Torquato Neto) saiu em 1984, um ano repleto de grandes lançamentos do Rock Brasil. A começar por Seu Espião, estréia do Kid Abelha (da vocalista e Sex Symbol Paula Toller), que trazia Pintura Íntima estourada em compacto, junto a Como Eu Quero, Fixação, Alice (Não Me Escreva Aquela Carta de Amor) e Nada Tanto Assim – esse LP vendeu mais de 150 mil cópias. Outro LP lançado em 1984 que arrebentou as portas da mídia foi O Passo do Lui, segundo dos Paralamas do Sucesso, que trouxe uma série de músicas que virariam hits, como Óculos, Meu Erro, Ska, Me Liga e Mensagem de Amor. Paralamas e Kid surfaram a crista das ondas de rádio naquele ano, que ainda teve discos como Tudo Azul (Lulu Santos), Ronaldo Foi Pra Guerra (Lobão e Os Ronaldos), Maior Abandonado (último disco do Barão Vermelho com Cazuza) e Phodas "C" (Léo Jaime). As bandas e artistas cada vez mais se tornavam íntimos dos programas televisivos de auditório. Ao mesmo tempo, o cinema detectava e esquadrinhava o fenômeno do Rock Brasil com o filme Bete Balanço, de Lael Rodrigues, com música tema do Barão Vermelho.

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